segunda-feira, 28 de setembro de 2009

Prêmio Sesc de Fotografia Marc Ferrez 2009


Arthur Monteiro

Imagem intitulada Conscientização ecológica, agraciada com o segundo lugar.

terça-feira, 8 de setembro de 2009

Páginas policiais














Quem já teve a infelicidade de frequentar as páginas policiais como personagem ou testemunha, e não apenas na confortável posição de leitor – ou de voyeur –, reconhecerá nessas fotografias de Arthur Monteiro um registro da vida como ela é. O trágico e o banal estão ali, lado a lado, desconcertantemente próximos. Como a luz amarela sobre o asfalto, tornando quase bela a forma do lençol no chão. Quase. Como disse Drummond, uma coisa são duas – ela mesma e sua imagem.

Elas mesmas, as coisas, são as seguintes: batida policial no Setor de Indústria, à procura de ladrões de carro. Perícia no local de um assassinato, em Samambaia. Empresário assassinado no Setor de Postos e Motéis, em frente à Candangolândia. Merla apreendida no Chaparral (Ceilândia Norte). Suspeito de envolvimento na fabricação de merla. Delegado da 21ª DP (Taguatinga Sul) durante apuração de um assassinato. Jovem acusado de matar os assassinos do irmão, todos envolvidos em acusações de tráfico. Velório no cemitério Campo da Esperança. Velório da primeria pessoa morta por dengue no DF. Morte por linchamento no Céu Azul (o morto era suspeita de latrocínio, roubo seguido de assassinato). Policiais acusados de matar por espancamento um comerciante da Ceilândia. Debaixo do jornal, o corpo de um homem assassinado por dívidas de jogo, num boteco em São Sebastião. Menino de doze anos atropelado por um caminhão na Via Estrutural.

Difícil lidar com essas legendas, assim agrupadas. Informações duras e cruas. Foi exatamente dessa forma que Arthur as apresentou, quando solicitado. Para mim foi mais fácil lidar com as imagens. Talvez uma coisa sejam três: ela, sua imagem e todo um universo de informações.

Usha Velasco

domingo, 6 de setembro de 2009

Eloge de ma fille







As imparidades de sua trajetória se refletem num olhar apurado sobre o que de insondável há na alma feminina por uma tangente de sensualidade. Mesmo antes de sua primeira exposição, em 1975, a fotógrafa francesa Irinia Ionesco já havia despertado o interesse de um grupo particular de artistas; mas seu êxito – paradoxal - e aclamação viriam de seu maior escândalo; a exposição Eloge de Ma Fille entraria na galeria Nikon de Paris e era esse mesmo olhar fetichista agora voltado para ela, Eva Ionesco... dos 5 aos 10 anos, em ensaios eróticos.
Segundo Irina, a proposta que originou a série de fotografias surgiu da própria Eva; eram sem dúvidas anos muito diferentes dos nossos, de uma busca e aceitação da liberdade sexual, ou ainda da liberdade dos corpos. Como mulher e artista, fruto de sua época, não pareceu estranho à francesa que Eva também pudesse ser alvo de fotografias simbolistas e que fosse focada exatamente como as outras mulheres, adultas, alvos das lentes de Irina.

As datas divergem - uns falam em 4 a 11 anos, outros de 5 a 10 anos de idade; ficamos aqui com a segunda possibilidade por ser a mais encontrada nas fontes – mas, sistematicamente, ano após ano, a fotógrafa utilizou sua filha como modelo em fotografias branco & preto de extremo apuro e ousadia. Ousadia até maior que a encontrada nas demais imagens obsessivas produzidas por Ionesco, muito maior. Eva aparece em nus, mas o efeito aterrador é o mesmo se ela é capturada vestida, como isso? É intrigante.
Assim a menina Eva surge como criança-mulher nos mesmos ares sombrios, ornada com dezenas de jóias ou bijuterias ordinárias, artefatos que falam deste mundo particular onde convivem delírio, morte, sensualidade e paixão. Seria quase uma entidade, um totem, um mito... Mas Eva era e é real: o choque é inevitável. Comunidade artística e opinião pública se puseram maciçamente contra Irina; a primeira – que já classificava seu trabalho como um desfile de maus gostos – considerou a coleção como o ápice dos absurdos, aquilo simplesmente não era arte. Já o público, numa oposição já esperada e recorrente, a execrou alegando uma falta explícita de moralidade.
Nada disso, logicamente, impediria Eloge de ma fille de entrar para a história da fotografia e do erotismo. Mesmo hoje, em que vivemos tempos de tão intenso tráfego de material de pedofilia, tempos que talvez nos turve a visão para certos aspectos fascinantes do bizarro ou do cruel, as fotografias que Irina Ionesco fez de sua filha permanecem inadvertidamente cheias do mesmo conceito, da mesma busca pela natureza do ser mulher vista através dos anos que passam para Eva e a revelam tão ou mais terrível (e uso terrível no sentido de espantoso) que a Lolita de Nobokov.
Abaixo, ficam aos leitores suas próprias interpretações, choques, achaques, absolvições ou engrandecimentos à obra prima de Irina Ionesco.

Fonte: uncovering

quarta-feira, 2 de setembro de 2009

Toda fotografia é uma farsa




Weimer Carvalho usa um gesto simples para produzir estranhamento e significados. Brinca com a identidade na tradição do retrato e ainda parodia o artista americano John Baldessari


Que bela foto!

Por Rodrigo Braga

Em maior ou menor grau, toda imagem é uma construção do fotógrafo, e todas as escolhas e elementos contidos no quadro são passíveis de leitura e interpretação. Mesmo no fotojornalismo, sabemos que a imagem é um misto do acontecimento, do referencial (ou seja, do objeto fotografado) e das intenções do fotógrafo. Ainda que essas “intenções” não estejam para ele muito claras no momento do click, não podemos negar que elas são parte do repertório da formação daquele indivíduo fotógrafo, seja profissional ou amador.

Peço licença aqui para abordar um assunto que, em parte, foge ao tema da entrevista para qual fui convidado no Paraty em Foco (fotografia e auto-representação). Digo “em parte” pois também quero dizer da minha própria prática para exemplificar meu pensamento.

Nos últimos meses venho refletindo bastante sobre os riscos de uma “bela” foto. Para além do discurso de que a beleza é algo muito subjetivo e de que isso não se discute, consideremos aqui aquele belo que está culturalmente entranhado no hábito do ver do homem ocidental e midiático, ou seja, aquilo que, no meio dessa profusão de imagens do mundo contemporâneo, agrada aos olhos de uma maioria. Falo do prazer estético do olhar, daquele gozo retiniano que nos acomete ao vermos uma imagem bem estruturada, equilibrada, fartamente colorida ou bem desenhada nos velhos moldes da fotografia em preto e branco. Nesse sentido, faço questão de incluir a minha própria obra nessa abordagem, uma vez que minha formação e inicial atuação como desenhista e pintor foram fundamentais (e muito) para construir minha identidade enquanto fotógrafo nos dias de hoje. Sobretudo na série Paisagens (2008), percebi o quanto fotógrafo como um pintor. Embora não busque objetivamente estruturar uma imagem sobre qualquer parâmetro clássico pré-definido, a realização de uma fotografia esteticamente bem resolvida acaba sendo inevitável, dada minha influência do universo artístico mais tradicional. Cada um ao seu modo, nesse mesmo contexto talvez nos encontremos todos nós, fotógrafos, que treinamos nosso olhar a fim de lançar ao mundo mais uma imagem significativa, tocante, enfim. Contudo, o que diz uma “bela” foto para além de um prazer estético mais imediato? Além do fator de atração seria também a beleza um elemento dissonante em potencial? Ou, ainda, poderiam ser criados outros padrões de beleza diferentes daqueles já estabelecidos?

É certo que os incríveis avanços tecnológicos da indústria fotográfica vêm facilitando a vida dos fotógrafos, sejam eles iniciantes ou veteranos. Com as estonteantes definições e recursos das câmeras profissionais (e até das amadoras) atualmente encontradas no mercado somadas às infinitas possibilidades de edição e “ajustes” de pós-produção, convenhamos que não é muito difícil se escolher uma imagem de qualidade dentre aquelas inúmeras que nossos cartões de memória sem fim conseguem armazenar e os velozes computadores podem processar. Daí não faltam comentários elogiosos dos nossos pares quando publicamos ao mundo nossas criações nas plataformas online de compartilhamento de dados – como o Flickr, por exemplo. Mas o que percebo, em muitos casos, é um esvaziamento das possibilidades cognitivas contidas em muitas imagens. É como se o elevado grau de beleza acabasse por abafar qualquer rompante de poder simbólico de uma imagem. Ou, pelo outro lado, aquelas imagens que fogem às “regras da boa imagem” costumam ser lidas com estranhamento e repulsa pelo público ou mesmo pelo sistema no qual estamos inseridos.

Volto agora à “intenção do fotógrafo”, que abordei no início, para deixar uma reflexão neste texto em aberto e repleto de dúvidas: o que de fato queremos enquanto fotógrafos? Seria arrebatar o público com prazeres estéticos imensuráveis? Seria arrancar elogios dos nossos colegas de profissão e amantes da “boa” imagem afim de nos tornarmos respeitados? Seria produzir para nosso bel prazer e, quiçá, mostrar aos demais nossas “crias”? Seria ter uma intenção simbólica e política clara? Seria simplesmente fotografar ou seria mais que isso…?

Fonte: blog do Paraty em Foco